quarta-feira, 19 de setembro de 2012


Escrevi esse conto pra Revista CLITORIS http://revistaclitoris.wordpress.com/, saiu na segunda edição.

Nada mais importa

Meu pau tava podre, uma ferida do naipe duma couve-flor bem perto da cabeça que fedia pra caralho. Justamente quando ela resolve dar pra mim. Era a garçonete mais linda dum barzinho pop metido a rock and roll, deliciosa, meio pirada, meio burrinha na sua espontaneidade, uma graça, já fazia uns meses que eu sonhava com sua bunda redondíssima, seus peitões a la american girl, sua boca tesuada. Depois dum pénabunda, sonhos exigem tornar-se realidade, do contrário, cê desiste deles, eu depositava minha última ficha naquilo, além do que: não fodia há mais de três meses.
Conheci ela fumando, quer dizer, já a havia sacado desde a primeira vez que pisei no lugar e devido a sua simpatia a gente sempre trocava uns “eaí, beleza” e ela me servia umas doses generosas de Domecq ignorando a porra do medidor, não tive escolha, fui me apaixonando a cada “eaí, beleza”, a cada novo trago, devo confessar: sempre tive uma queda por garçonetes tesudas, ela era a melhor, ao contrário do seu local de trabalho, mas foda-se, o que eu tava dizendo é que a primeira vez que conversamos – mesmo! – ela tava fumando, do outro lado da rua, num bequinho escuro. Duas ou três vezes na noite ela atravessava a rua e entrava no beco, depois dum tempo saquei que ela fazia isso mais ou menos às 23, à 01 e nos finais de semana às 4 ou 5. Era uma sexta à noite ou coisa assim, um dia de movimento no lugar, depois de incontáveis doses mais que generosas, eu diria até: amorosas, eu entendi que desejá-la platonicamente tornara-se algo tão inútil quanto incômodo. Passava das 5, eu tava ali desde às 4, no beco, feito um bicho acuado, só esperando ela pintar, quase achando que tudo num passava de mais uma fantasia alcoólica que dali à algumas horas desapareceria pra dar lugar a uma puta dor de cabeça dos infernos. Mas eis que surge, distraída sacou o cigarro, estalei meu zippo fake furtado duma barraquinha paraguaia, num movimento quase coreografado, treinado incansavelmente durantes semanas, o resultado não foi lá o esperado, fez um barulho danado e um fogo dos diabos. Pobre gostosa, quase enfartou, acalmei o coração que havia debaixo daqueles peitões com um “relaxa baby” seguido dum “eaí, beleza” depois que ela relaxou, sorriu “beleza”, aceitou meu fogo, reclamou da dupla-pop da noite (tavam tocando O Rappa) e do movimento do bar que a impediu de fumar antes, e foi só. Ela era daqueles tipos faladores, que gostam de remoer um assunto banal qualquer até a exaustão e acham que o tempo dum cigarro é insuficiente pra que um interlocutor entenda o quanto um lugar pode ser chato quando cê tá afim de fumar. Mas como foi bacana sacar aquela boca em movimento, engatando frases imensamente mais complexas que um “eaí, beleza”, ah só mais um pequeno detalhe, os caras começaram um “Nothing Else Matters” do Metallica – no fim do cigarro, no meio dum assunto a muito acabado – uma pegada mais que pop a dos pretendentes metaleirospops... ela atirou longe a bituca e deu um pulo “Até que enfim, uma coisa que preste! Adoro Gun’s!!!” e foi-se saltitante, atravessou a rua levando consigo aquela bunda maravilhosa e eu só não brochei por que, bem, cê sabe.
Só numas de encher o saco, ranzinzar um pouco – bem rapidamente, já volto ao que (imagino) interessa –: Nunca entendi essa coisa de uniformes, desde os tempos de escola eu num ia muito com a idéia, sei lá, essa padronização toda e o caralho. Trabalhei na porra dum supermercado por uns tempos e o uniforme era amarelo e a porra do supermercado era grande e empregava uma cacetada de gente, de modo que as camisetas amarelas tavam por toda parte nos horários de entrada, saída e almoço de cada um dos turnos da parada. Enquanto a gente tentava chegar em casa, éramos obrigados a ouvir a cada 10 passos, piadinhas do tipo: “tem uma carta aí pra mim, carteiro?” era uma merda, os filhos da puta te empalam, bebem teu sangue, te tratam como lixo em troca dum saláriozinho vergonhoso e ainda te expõe ao ridículo te fazendo passar por garoto propaganda – tá certo que era só botar outra camisa antes de sair pra rua, eu até que fazia isso, mas porra, é difícil demais pensar nesse tipo de coisa quando tudo que se quer é chegar naquilo que cê chama de lar e engolir qualquer coisa ou simplesmente apagar. Caralho, tá tudo errado nessa porra de mundo, os socialistas deviam fazer qualquer coisa a respeito, além das reuniões de partidos, podiam começar organizando greves contra o uso de uniformes. Nos tempos da escola era ainda pior... ah, deixa pra lá. O que eu queria dizer é que o pessoal que trabalhava nesse tal bar, usavam um uniformezinho ridículo que tentava inutilmente fazer referência aos trajes de policiais rodoviários ou coisa que o valha, eles eram os mestres da publicidade, o nome do lugar era “Easy Rider”, nas paredes uma porrada de quadros com retratos de escritores beats e bluseiros e rockeiros e trechos da rota 66 e até uma parede dedicada ao grande Dennis Hopper, um lugar bacana, mas era só fachada, um lugar pra bandas pops bacaninhas tocarem pra galerinha cult-alternativa. Um verdadeiro lixo e eu num saía dali. Aguentava tudo calado, só pra poder ver aquela gostosa carregando bandejas dentro daquele uniformezinho que de forma alguma escondia seu recheio. Caralho, um cara apaixonado é capaz das piores babaquices possíveis. Eu era um babaca, apaixonado e redundantemente cheio de esperanças. Quem espera sempre alcança – é assim que eles dizem, né não?
Meu dia chegou, pode crê. E aquela porra de ferida fedorenta tentando empatar a – acreditava eu – mais maravilhosa futura foda da minha vida. Ela queria dar pra mim, não foi exatamente essas as suas palavras, mas porra, era isso que ela quis dizer com: “amanhã tô de folga, vamô beber alguma coisa em algum lugar?”, ouvir aquilo foi mais emocionante que ouvir pela primeira vez o “Envelhecido 12 anos” dos Bêbados Habilidosos, a minha reação foi a mesma, sem palavras balancei a cabeça positivamente emocionado, o mundo já não era um lugar tão ruim pra se viver. Combinamos lá em casa às 9.
Saca esses carinhas virgens? Ou babacas místicos apaixonados, preparando o ambiente, baseados bolados, incensos, discos na agulha, vinhos e o caralho. Era eu às 7. Eu e a maldita pereba, eu e a apreensão toda – por causa da pereba – encarando meu pau mole com uma gilete na mão, sem saber se devia ou não usá-la, acovardei-me, eu e minha covardia. Ela chegou.
Sem o uniformezinho. Um micro shortinho jeans, desses da moda, desfiados, com fundos de bolso aparecendo, um salto mais alto que o necessário, Axl Rose estampado numa camiseta preta sem mangas nem gola, recortada na altura do umbigo – maravilhoso, diga-se de passagem – uma mochila com 3 cervejas importadas, objeto de furto do patrãopop que pagava suas contas. Atacamos as cervejas, ela negou o baseado, não usava drogas, botei pra tocar um mp3 do Metallica, todos os álbuns tavam ali, Kill 'Em All  é bacana, depois fomos de vinho e ela falando desenfreadamente, sentada no meu colchão e aquelas pernas esticadas tão próximas de mim, comecei passando a mão de leve enquanto ouvia suas asneiras pops com Master of Puppets de fundo, ela num parecia querer trepar, queria ficar falando, a porra da paciência é uma merda duma virtude, garrafas de vinho tem o seu tempo, esperei, depois da segunda ela foi ficando menos arisca, aceitando melhor meus elogios e minhas carícias tendenciosas, o lance ia rolar, só o que me preocupava era a pereba, o vinho acabou, mas em compensação eu tava beijando aquela boca tesuda, uns beijinhos de leve, ela era cheia de fazer cu doce, mas tava afim, pra facilitar um pouco as coisas alcancei a garrafa de conhaque que marcava por ali, dei um bom gole e passei pra ela “ai, whisky me deixa muito bêbada”, mas mesmo assim deu um gole dos bons também “num é whisky” como era gostoso aquele corpão roçando o meu “bom esse whisky” “é conhaque” “uma delícia”.
Caralho, ela que era a delícia da minha vida. Meu pau doente tramando suicídio, prestes a explodir aquela ferida em putrefação ralando na calça jeans. O que eu podia fazer? Sem conseguir pensar em nada melhor, resolvi executar o único plano que tinha em mente, falei que ia mijar e segui pro banheiro, botei com cuidado uma inoportuna camisinha sabor menta, numas de disfarçar o cheiro e tentar esconder a merda da ferida, já que essas camisinhas afrescalhadas são tão afrescalhadas que têm cor, essa era verde. Puta troço estranho esse de camisinha colorida, tô ligado que tem gente que tem fantasias e a coisa toda, mas pô, um pau encapado em plástico já é deprimente, em plástico colorido então, é mais que brochante. Foi o que rolou, brochei. Sei lá, fui ficando nervoso, aquela desgraça doía quando a merda da camisinha encostava e tinha aquela puta gostosa lá fora me esperando, dentro daquele micro-short da moda, tomando conhaque pensando que era whisky, confundindo Metallica com Guns. Voltei derrotado pro quarto, brochantemente derrotado e ela ali deitada com aquela bundona virada pra cima, o pau indigno reclamou sua reputação, tornou-se uma rocha, bichada, mas uma rocha. Deitei do seu lado quase em cima com a mão já apertando aquela bunda tesuada e ela foi dando uns gemidinhos e esfregando os peitões e foi levantando e eu na sua cola e ela meio querendo sem querer, fazendo charme ou qualquer coisa do tipo “cadê o whisky? Eu quero um gole” e virou a garrafa com sede, depois me beijou, aquilo foi incrível, um belo beijo de conhaque, me embebedei porra, eu num vi mais nada, tesão puro, saca? Correndo nas veias mais veloz que qualquer droga injetável, um puta tesão.
Cê sabe, tesão num entende nada de doenças venéreas, muito menos te deixa lembrar que você possui uma e que ela fede e é feia pra caralho e cê num deseja uma merda dessa pra ninguém, muito menos pruma roqueirinha daquele naipe. Nunca gostei muito do Axl, sempre preferi o Slash, fui tirando a camiseta dela, como se aquilo me insultasse, ela soltou um “ai” misto de prazer e incômodo, me atrapalhei com o sutiã, quando ela sacou que se aquilo não abrisse ‘já’ não abriria nunca mais, aliás, não seria mais nada, nunca mais, deu um jeito de desabotoar o negócio... meu Deus... Satanás ou o caralho que for, eram os peitos mais lindos que já vi em toda a merda da minha vida, saca esses peitões que incrivelmente desafiam a lei da gravidade? Pois é, era um par desses que ela tinha, dois belos bicos rosados simetricamente perfeitos, apontando pra Deus – Satanás tava mais embaixo e eu já chego lá – primeiro dei uma lambida meio selvagem em cada um, não houveram outras, o que ocorreu depois pode ser definido como ‘drenagem’, eu queria aqueles peitos todos dentro da minha boca, eu queria mastigar e engolir cada um deles, eu tava loucão com aquela porra de Metallica na minha cabeça, nada mais importava, nada além do tesão, arranquei com facilidade short e calcinha e cai de boca numa buceta recém depilada num estilo punk, quis entrar ali dentro, mas não foi possível, resolvi enfiar o pau. Caralho, ela era toda apertadinha, meti como quem conta os últimos segundos, antes da bomba explodir e satanás sorrir, porra nenhuma, eu era satanás, eu tava uivando mais que o Howlin´ Wolf, mas num era de prazer não, era de dor, parece que isso assustou ela um pouco, depois dum tempo, quando eu já tava quase virando lobo, ela deu um jeito de cair fora, “calma, calma, por favor, calma” ela falava. Será que eu tava tão assustador assim? “Tenho que ir embora, cadê minha calcinha?” Pô, tava doendo, mas eu aguentava, tava gostoso. Onde é que ela tava indo? Ao banheiro quando gritou desesperada. Uma barata, pensei, e abri os olhos na direção dos gritos que não acabavam nunca, um puta rastro de sangue no chão, começava no colchão e seguia até onde ela tava, imóvel, ainda gritando “Eu tô sangrando, me ajuda!!!” – suplicava – “relaxa, cê só tá menstruada.” – eu tentava acalmá-la – “Num é menstruação!!!!” ela esgoelava. Enfim, um puta panpeiro, por fim resolvido com um bocado de papel higiênico enrolado. Enquanto se vestia “Nothing Else Matters” começou a tocar, aí ela meio que congelou, deixou a calcinha caída na altura dos joelhos e ficou ali, meio que em transe, olhando fixamente pro rádio tocando, uma cena bacana de se ver, mas o cuzão do Hetfield fudeu com tudo quando começou a cantar, ela saiu do transe como quem sai da sala pra cozinha e terminou de vestir a calcinha, ajeitando o pequeno maço de papel ali naquela perdição e logo já tava toda vestida. “...tchau” – falou antes de sair, depois de dizer: “Adoro Guns! Esses outros rock que a gente tava ouvindo é muito pesado...”
Substitui o Metallica por um Tom Waits e fiquei ali, sacando as paredes, fumando o baseado desprezado, me sentindo mal, mas ao mesmo tempo bem, saca? Dei uns goles no conhaque e até senti um levo sabor de whisky, antes de apagar.   Acordei estranho pra caralho, no meio de sangue coagulado em boa parte do lençol, bem no meio do quarto tinha aquela mancha marrom marcada de pés e bitucas e cinzas de cigarro, nojento, mas nem por isso meu pau deixava de permanecer duro e eu ali com aquilo sem a menor vontade de bater uma. Mó trauma daquela maldita ferida, foi aí que eu resolvi, fui decidido pro banheiro e pequei a gilete, e... ué! A merda da pereba num tava mais ali, tinha só uma marca que deixava claro que muito sangue saiu dali. Tava tudo explicado.
Sei lá se passei pra ela minhas feridas, até a procurei uns dias depois, lá no popbar, ia esclarecer o mal entendido e sugerir que procurasse um médico. Antes que eu conseguisse qualquer coisa nesse sentido, ela foi categórica: num queria mais dá pra mim, por que eu era muito violento e parecia um bicho selvagem e a fiz sangrar e quase morrer de hemorragia. Não me deu chance de falar, nem ao menos de pedir um conhaque, fui embora um tanto magoado. Nunca mais apareci no lugar.
Às vezes eu fico com a mó vontade de pintar por lá, ficar olhando praquela bunda e praqueles peitos, só sacando a forma como eles se mexem, de longe, do beco, escondido, feito um bicho selvagem de verdade, aí quando ela chegasse sacando o cigarro, eu faria um movimento calmo com o zippo, silencioso e infalível, aí eu ia dizer olhando por entre a chama: “baby, tem uma coisa que eu acho importante que cê saiba: “Nothing Else Matters”, num é Guns, é Metallica”. Mas eu num sou tão selvagem assim.

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