Tá certo, eu já era um garoto inquieto colecionando
revistas Metal Head, ouvindo Black
Sabbath por uma suposta rebeldia. Mas tinha as HQs dos heróis e os livros de
História, pastel na feira quarta à tarde. Dias bons. Primeiros acordes no
violão.
Com o tempo veio o Raul e ela foi aparecendo, umas
visitas rápidas à noite, num falou seu nome nem nada, a princípio. Só sentava
do meu lado, ficava um pouco olhando pra minha cara, como uma guria virgem sentindo
qualquer coisa diferente entre as coxas. Era bonita, mas tinha as fitas K7s,
pedidos por telefone, o rádio gravador, a urgência de conhecer toda e qualquer
canção. Tente outra vez no violão.
Depois o punk, pichar muros, fanzines panfletários,
passeatas no primeiro de maio, revolta e indignação. O mundo não é bom, ela me disse. Agora tava mais à vontade, vinha e
ficava por mais tempo, andava pelo quarto. Seus olhos eram encantadores. Mas
ainda tinha a esperança e Bakunin e as pingas com refri, a revolução. Três acordes no violão.
Eu ainda não conhecia as canções destruidoras do
Tom Waits, nem as baladas emocionantes da Saco de Ratos, os blues despedaçantes
dos Bêbados Habilidosos, os poemas nocauteantes de Charles Bukowski. Eu tinha
os amigos por perto, bebia com eles, às vezes fazia umas merdas por isso, mas
tudo bem, no outro dia a ressaca era só ressaca, vomitar pra beber de novo. Eu
ainda não tinha sacado o quanto ela é importante, vital. Nenhuma garota havia caído
na estrada depois de me chutar o rabo, arrasado com meu coração.
Hoje... é só blues no violão.
Do livro: Num dá pra apagar os riscos dum disco furado.
Do livro: Num dá pra apagar os riscos dum disco furado.
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